sexta-feira, 2 de abril de 2010

Nerd não, agora é Geek


Até parece outro o Júlio Câmara que se envereda pelos caminhos virtuais. Na internet, é um blogueiro falante e antenado. Contrasta com o menino magrelo de 14 anos que, com a mãe às voltas, ensaia uma certa timidez.

Poderia-se dizer que Júlio tem trejeitos nerds evidentes, mas isso seria tocar em um vespeiro. Definir estereótipos e encaixar pessoas neles sempre será suscetível à polêmica. Se há quem fuja do rótulo de nerd, também existem os que fazem questão de ser um. Na dúvida, é o próprio Júlio que define seu caso:

- Sou geek - esclarece, em tom de orgulho, recorrendo a um termo que atualmente está na moda entre os mais conectados ao mundo da tecnologia.

Quando se fala em nerd, há logo quem se lembre de filmes ao estilo de A Vingança dos Nerds (1984), em que são estigmatizados como indivíduos anti-sociais, que só querem saber dos estudos. Mas essa imagem - muitas vezes pejorativa - já não cola mais. Surgiram os geeks, um novo tipo de nerd, mais descolado:

- Com a popularização da tecnologia, mais gente pode estar assumindo o papel. Não é coisa mais de um gueto. Estão em tudo que é canto - opina o presidente da Associação Software Livre, Sady Jacques.

Há ainda quem ache que "todos nós seremos nerds", como o gerente de novas tecnologias da IBM Brasil, Cezar Taurion.

- Para a garotada que está aí, usar o computador é tão natural como jogar futebol - justifica.

Júlio que o diga. Demonstra desenvoltura ao "brincar" nas configurações de seu micro e até consegue um dinheiro extra fazendo sites na internet.

Mas engana-se quem pensa que Júlio é o melhor aluno da turma: no colégio, passa na média. Também é o tipo que se desconecta da internet para jogar bola com os amigos.

Sutilezas assim contribuem para que o menino, na verdade, seja parte do que se pode chamar de nova geração de nerds.

Para o psicólogo Erick Itakura, do Núcleo de Pesquisa em Psicologia e Informática da Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, geek e nerd são a mesma coisa. Na sua opinião, o que mudou ao longo dos anos foi a aceitação social das pessoas ligadas em tecnologia.

- Antes, ficavam confinadas. Hoje, o que tem de comunidade sobre o orgulho de ser nerd no Orkut... Essas pessoas começaram a se encontrar, formar grupos sociais - diz.

No livro GeekChic - The Ultimate Guide to Culture Geek (GeekChic - guia definitivo da cultura geek, sem tradução em português), o jornalista americano Neil Feineman acompanha o movimento cultural que transformou os nerds em geeks. "Nunca tivemos uma melhor época para ser geek", escreve, ao alegar que o futuro pertence a essas pessoas exatamente devido à popularização da tecnologia.

Mais gente tem se aproximado dos nerds, se espelhado neles ou, pelo menos, dependido deles. É a Júlio que os amigos recorrem em busca de dicas de software. O guri cursará o 1º ano de Ensino Médio em 2008, mas já pensa na faculdade: computação, é claro. Como ícone, não cita Bill Gates, o meganerd que se tornou o homem mais rico dos Estados Unidos.

Para Júlio, o exemplo é Steve Jobs, um geek fascinado pelo design dos produtos, que revolucionou a música digital com o iPod e em 2007 apresentou ao mundo o iPhone, a novidade mais comentada do ano. Só que Júlio também não sonha em trabalhar na Apple. Quer vestir a camiseta da marca mais valiosa do planeta, o Google.

Considerada a melhor empresa para se trabalhar pela revista Fortune, imagine qual é o tipo de profissional que o Google procura?

- Hoje tem valor em ser nerd. Aqui no Google, somos meio geek, e buscamos pessoas dedicadas, bons alunos, mas com facilidade de interagir. O Google procura nerd geek social - diz o diretor de comunicações do Google Brasil, Carlos Felix Ximenes

Materia publicada no Jornal Zero Hora de Porto Alegre/RS